quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Histórias do Paraná - Pato Branco bravio

Histórias do Paraná - Pato Branco bravio

Pato Branco bravio
Fátima Maria Bortot

Ano de 1949. Pato Branco, Sudoeste do Paraná, não tinha mais de mil habitantes.
Levas de migrantes chegavam de muito lugares, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, principalmente.
Uma nova fronteira estava se abrindo.
Pouca bagagem, muito sonhos.
Foi o que aconteceu com duas famílias, procedentes de Porto União.
Casais ainda jovens, instalaram-se numa chácara, afastada do centro do povoado.
De outras bandas, também aportaram em Pato Branco um rapaz que trabalhava numa serraria, na então chamada Vila Bonita.
Suas histórias iriam se cruzar de modo dramático. E sangrento.
Naquele dia, ele saiu do trabalho e foi até a chácara.
Ao voltar para casa, deixa dois cadáveres em seu rastro: uma mulher e o chefe da outra família.
"Seu" Ormazinho Viganó, não se sabe como, desconfiou. O autor do bárbaro crime seria o rapaz.
Naquela noite, Viganó, o delegado Chico Deus e Abel Bortot, que possuía um Dodge 46, e mais os dois policiais lotados na delegacia, seguiram em expedições para a serraria. O rapaz dormia.
Quando foi acordado, num barraco, recebeu voz de prisão do delegado.
Com ele foram encontrados objetos e roupas de propriedade das vítimas.
Amarrado com corda nos pulsos e nas pernas, foi levado para a delegacia. O dia estava amanhecendo e as manchas do Sol pareciam, em premonição, banhar de sangue o horizonte.
Dia claro, todo mundo na pequena cidade sabia do ocorrido e onde estava rapaz.
Na cadeia, no mesmo local onde hoje está instalado o Hotel Bedim, a tensão crescia.
Inconformada com o duplo homicídio, a turba foi falar com o delegado Chico Deus.
Queriam justiça.
Com as próprias mãos. Não tiveram sucesso.
Voltaram para casa, mas a revolta persistia, fermentava.
Horas mais tarde, retornaram à delegacia.
Foram informados por Chico Deus que o rapaz seria transferido para a cadeia de Clevelândia, sede da Comarca, que oferecia mais segurança.
Como hoje, faltava estrutura para a polícia. O delegado recorreu a um "carro de praça". No carro seguiram o motorista, um dos policiais e o preso, algemado.
Mas, a 400 metros da delegacia, perto de onde está hoje o predio do Branco do Brasil, na Avenida Tupi, um grupo de pessoas esperava.
Eram muitos, brandindo paus, facas e armas de fogo. O preso foi arrancado do táxi e linchado.
Um fotografo registrou toda a cena.
Na linha de frente, na foto, aparecem antigos moradores daquela Pato Branco bravia, quase sem lei e sem alma.
Se todos participaram do linchamento, não se sabe, mas posaram para o fotógrafo diversos pioneiros, hoje chefes de ilustres famílias da cidade.
- Esta orelha vou levar de lembrança, chegara a comentar, após o golpe de facão, o irmão da mulher assassinada.
Dois meses depois, surge um caminhão na cidade, apinhado de soldados da Policia Militar, sob o comando do delegado-tenente Lapa, deslocado de Curitiba.
Começaram as investigações, a partir da foto.
Interrogatórios.
Depõem, um por um, os integrantes da fotografia.
Os que diziam a verdade, afinal explícita na foto, eram liberados.
Os que negavam a participação, levavam uma "tunda de laço" antes de serem colocados em liberdade.
Ninguém prestou contas a justiça.
Toda a população, ao final do inquérito, foi desarmada. E, conta-se até hoje, os policiais retornaram a Curitiba com um segundo caminhão, carregado de armas.
Numa oficina, os policiais apreenderam alguns dos muitos revólveres.
Foi o único linchamento na cidade que se tem registro na memória dos antigos moradores, como "seu" Domingos Bortot, que viu uma cidade nascer no meio do sertão, onde, de fato, viver era perigoso.

Fátima Mirian Bortot, jornalista


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