quarta-feira, 25 de maio de 2016

Histórias do Paraná - A vingança da onça

Histórias do Paraná - A vingança da onça

A vingança da onça
Luiz Cláudio Mehl

A colônia Murici está bem próxima de Curitiba, e mais ainda da costeira da Serra do Mar.
Ocupada predominantemente por agricultores poloneses, é dali que a Capital se abastece de batata, frutas e legumes.
E também de suas matas que é extraída grande parte da madeira que abastece as olarias curitibanas.
Entre oleiros estavam os Filhos de Henrique Mehl, que ali possuíam uma fazendola.
Pois bem, no princípio dos anos 70 os fazendeiros daquela região estavam extremamente preocupados com o
desaparecimento de inúmeras cabeças de gado.
Algumas informações diziam que seriam umas 50, outras falavam em cem, e havia até que falasse que cerca de
200 cabeças de gado já haviam sumido.
Exageros de lado, de uma coisa não restava dúvida: as ossadas encontradas indicavam que era um felino, e dos grandes, o responsável pelo estrago.
Daí porque o Júlio Luz, chacreiro dos Mehl, convidou seu compadre Alcindo de Melo, reconhecido como emérito caçador, para procurar a bichana misteriosa.
Os dois caçadores, auxiliados por dois perdigueiros e pelas balas de uma "Winchester 16", abateram o animal após duas semanas de perseguição. O mistério desvendado tinha dois metros de comprimento e aproximadamente 20 anos de idade.
Para comprovar a veracidade do feito, os caçadores puseram o corpo do animal numa caminhoneta e foram correr os jornais de Curitiba, exibindo o troféu.
As manchetes, no dia seguinte, eram bombásticas: "Onça morta já tinha matado mais de cem", apontava a "Gazeta do Povo", "Onça morta a tiros", registrava a "Tribuna do Paraná". A notícia chegou até o Rio de Janeiro, e o Jornal do Brasil estampou a foto do bicho com a manchete "Onça Assassina".
Enquanto isso, os Mehl era multados em mil cruzeiros pelo Instituto de Defesa do Patrimônio Natural por falta de licença para matar o animal. E em seguida foram notificados a pagar outros 150 cruzeiros de multa por violação do código de caça florestal, que proibia a caça fora de temporada.
Até então, matavam-se onças com a impunidade como quem atravessa um sinal fechado às três horas da madrugada e sem nenhum guarda por perto.
Dessa vez, porém, a reação não ficou só nas multas. A opinião pública se dividiu a respeito e o assunto ganhou ares de discussão.
Não faltou, é claro, quem se posicionasse a favor dos caçadores, como o colunista social Carlos Jung, de "O Estado do Paraná", que ironicamente alertava os futuros caçadores de onça para não esquecerem de amarrá-las antes de atirar; correndo em seguida para, em Curitiba, tirar as devidas licenças.
Recomendava também a necessidade de avisar a onça para não aparecer nas fazendas fora da temporada de caça.
Ironias a parte, os primeiros aprendizes de ecologistas gritaram de norte a sul do país em defesa da fauna brasileira, coisa rara de se ouvir naqueles tempos.
Estava começando uma nova era no país, a era da defesa do meio ambiente.
Melhor que ninguém, o "Jornal do Brasil", do Rio de Janeiro, captou o que começava a acontecer a partir da matança de uma onça no Paraná. O jornal dedicou ao tema um editorial, intitulado "Vingança da Onça", que reparava: "...depois de morta, a onça vingou-se do fazendeiro que a matou..." E concluía: "Ao fazendeiro resta o consolo pela honra de ter participado do capítulo inicial de uma história de luta pela preservação do patrimônio natural do nosso país".

Luiz Cláudio Mehl, Engenheiro Civil


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