Histórias do Paraná - Aquele menino
Aquele menino
Nivaldo Kruger
Numa noite destas saí por aí, pelas ruas da cidade a andar, vendo os enfeites pendentes dos edifícios em jorro de luzes; nas ruas e praças simbólicas árvores luminosas; em muitos lares, jardins e fachadas, decorações em cordéis faiscantes, multicores, dando à noite um visual festivo.
A cidade enfeitou-se e está faceira para o Natal do Menino Jesus.
A noite já ia avançada quando no calçadão, entre as portarias do Hotel e do Clube, que se defrontam, encontrei de pés no chão desmangolado e mão estendida, sozinho, a pedir, aquele menino.
Feéricas, as luzes faiscavam.
Olhei-o firme e vi nos seus olhos profundos aqueles brilhos refletidos parecendo tão distante... de outros mundos...
Olhou-me, seu sorriso infantil era cansado, e cansada a expressão envelhecida daquele menino.
Aos sons derramados do clube e da boate misturavam-se ternos acordes da "Noite Feliz", vindos de algures lembrando o nascimento de outro Menino...
Mas de onde teria vindo aquele menino frágil entre aquelas luzes dos majestosos prédios de portas fechadas?
Quem seria ele?
Parti.
Segui em frente, e ele ficou ali.
Continuei andando, mas aquela singela figura tão humilde e desprovida me acompanhou no pensamento.
Na magia do pensar transportei-me no tempo para outra cidade nos montes escarpados da Judéia: Belém, que também fora de repente iluminada por um candente facho celestial que apontava para uma gruta e uma manjedoura, onde acabara de nascer aquele Menino para quem as portas da cidade também se fecharam naquela noite em que o casal de viajantes, José e Maria, buscaram alojar-se...
Assim o estábulo rústico e os inocentes animais moldaram para sempre o cenário do inesquecível Natal.
Mas, e aquele menino?
Senti vontade de voltar, vê-lo de novo.
Estender-lhe a mão, abraçá-lo como a um irmão, um filho, ofe-recer-lhe mais do que o mísero trocado que pedira.
Voltei.
Procurei e não mais encontrei-o.
Havia-se ido e, em seu lugar ficou um vazio que as luzes não preenchiam.
O silêncio da noite caiu sobre mim pesado, nem os sons se ouvia, não reencontrá-lo, por esquisito que pareça, fez-me desamparado, insignificante, diante da misteriosa e imensa amplidão daquele firmamento repleto de estrelas a me olhar procurando aquele menino...
Nivaldo Kruger, ex-deputado e ex-prefeito de Guarapuava
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