Histórias do Paraná - A bandeira que foi tapete
A bandeira que foi tapete
Josué Corrêa Fernandes
Ouvia de meu pai que o Major Fidêncio Leme do Prado, voluntário na Guerra do Paraguai, curitibano, que viveu a maior parte da sua vida no interior do município de Imbituva, fora quem arrebatara do gabinete presidencial de Solano Lopes, em Assunção, a bandeira brasileira que ali servia de tapete e que se constituía em troféu de guerra, tirada que havia sido do navio "Marquês de Olinda".
A família Leme do Prado, rebatizada para Lemos do Prado, é muito grande, espalhando-se por várias cidades, principalmente no sul do Paraná. Em Prudentópolis mesmo, há o vereador de segundo mandato, Gilberto Leme do Prado, sucessor direto de Fidêncio.
A história que desde criança me comovia, vim a confirmá-la muitos anos depois, no Museu Histórico Nacional e nos arquivos do "Jornal do Comércio", do Rio de Janeiro.
Com vinte e um anos de idade, Fidêncio apresentou-se espontaneamente na 4a Cia. do 27° Corpo de Voluntários da Pátria.
Seu batismo de fogo, desembarcando em S. Francisco do Uruguai e cruzando o Rio Paraná, foi nos combates de 22 e 24 de maio de 1866, onde saiu ferido, o que, no entanto, não impe-
diu que retornasse ao campo de batalha por três vezes no mês de julho do mesmo ano, participando do assalto de Sauce, das lutas de Lomas Valentinas, Peribebuy, Nieguassú e da rendição de Angustura.
Seu feito mais importante, porém, ocorreu quando o Exército Nacional, sob o comando do General Osório, entrou em Assunção, em 5/1/1869.
Diz Fidêncio, em entrevista ao "Jornal do Commercio" (ed. de 13/9/1922), que, uma vez aquarte-lados, ele, mais Clarindo José da Silva e Antônio Roberto, corneteiro-mor, dirigiram-se ao palácio de Lopes, nele adentrando sem encontrar resistência.
Enquanto seus companheiros permaneciam no andar térreo manipulando papéis de música, Fidêncio subiu ao último andar, ali encontrando o gabinete de Solano e uma bandeira brasileira estendida no assoalho, defronte à cadeira do governante paraguaio.
Imediatamente recolheu o pavilhão que se prestava de tapete, guardando-o na mochila e contando o fato aos que o acompanhavam.
Horas mais tarde, três prisioneiros esclareceram que não só aquela bandeira como também outra, ambas trazidas do vapor "Marquês de Olinda", estavam sendo utiÚza-das daquela mesma forma: uma, no Quartel General de Humaitá; e outra, no Palácio de Lopes.
Terminado o conflito, Fidêncio, elogiado por seu destemor nos cinco longos anos de campanha, promovido a Alferes, voltou ao Paraná, guardando, no entanto, a bandeira que considerava relíquia e que desejava usar como mortalha.
Nas comemorações do centenário da Independência, já com 78 anos de idade, Fidêncio resolveu embarcar para o Rio de Janeiro, levando o histórico pavilhão que por mais de meio século guardara, a fim de entregá-lo em mãos do Conde d’Eu, a quem chamava Marechal da Vitória.
Acondicionou o precioso símbolo numa caixa de madeira, onde fez inscrever em letras douradas: "A memória de D. Pedro II - O valor e a Constância".
O Conde d’Eu, no entanto faleceu antes da chegada de Fidêncio, e este, afirmando que o símbolo da pátria resgatado das mãos do inimigo devia ficar em local onde todos os brasileiros pudessem vê-lo e venerá-lo, encaminhou-o, através do "Jornal do Commercio", ao Museu Histórico Nacional, onde se encontra até hoje!
Josué Corrêa Fernandes, advogado, é secretário de Administração e Negócios Jurídicos de Ponta Grossa
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