sábado, 15 de novembro de 2014

Histórias do Paraná - Histórias de escravos

Histórias do Paraná - Histórias de escravos

Histórias de escravos
Luiz Romaguera Netto

I - Histórias de escravos

Na Europa, até o ano de 1800, existiu a Santa Inquisição, que deixou medo, desconfiança e causou muitos problemas entre toda a população.
Aqui no Brasil, poucos sabem que ela existiu e fez inúmeras acusações resultando em condenações as mais variadas, quase todas entre os escravos, tendo-se estendido até o ano de 1821.
Um desses Autos da Inquisição, o primeiro aqui em Curitiba, no ano de 1798, foi o de Brígida, escrava recém liberta por testamento do seu senhor. Já sexagenária, vivia de favores e, procurando o que fazer, especializou-se em ervas.
Algum usuário não contente com os resultados, denunciou-a anonimamente, como bruxa.
Os Autos da Inquisição correram e, apesar do pedido de perdão dos filhos do seu senhor, foi condenada à prisão perpétua (faltaram provas para inocentá-ia).
Insistiram e, em um segundo processo de pedido de perdão, conseguiram provar sua inocência, sendo absolvida. O curioso é que, por ser pobre demais e já velhinha, não foi libertada, ficando na prisão até sua morte.

II - Deixando de lado a Inquisição, contam-nos as histórias mais antigas o que se passou com uma outra escrava — Ignácia.
Tinha ela se casado com um pardo livre em Santa Catarina.
Quando seu senhor tomou conhecimento de que estava grávida, negou sua venda ao marido, coisa que já estava acertada.
Não se conformando com o acontecido, ela foge sozinha, tendo sua criança no mato.
Necessitando de recursos, vem morar perto de Curitiba.
Os anos se passaram.
Quando a criança já estava com 5 anos, foi descoberta.
Na iminência da prisão, voltou para o cativeiro. Não se conformando, estrangula seu filhi-nho com as próprias mãos, para não vê-lo escravo.
A população considerou seu crime bárbaro, não permitindo que fosse entregue ao seu senhor.
Responde ao processo crime, sendo condenada à morte.
Sua execução deu-se no ano de 1871, no paço municipal, por decapitação a machado. O corpo, depois de envolvido em trapos, foi jogado na correnteza do rio.
Como na cadeia pública não tinha nenhum preso condenado, Joaquim, seu carrasco, teve que ser trazido de São Paulo.
Os custos da execução ficaram em 10$800, assim distribuídos: 6$000 para os soldados e 4$800 para o carrasco.

III - Antônio, um escravo agressivo e brigão, avança sobre seu senhor, Joaquim Ferreira, na Villa de Antonina, deixando-o desacordado.
Em seguida, agride sua patroa, respeitando-a por ser mulher casada.
Entretanto, não procede do mesmo modo com as duas filhas do casal, violentando-as.
Uma escrava, ama das meninas, também é violentada, culminando por matá-la.
Os empregados acodem e, junto com o capataz, salvam as meninas que estavam à beira da morte.
Levado a julgamento, é condenado, aqui em Curitiba, a pena galés perpétua, o que significa que teria de viver toda a sua vida acorrentado em um navio remando.
Nunca mais veria a luz do sol.
Inconformado com a sentença, solicitou um novo julgamento, tendo ficado na prisão, como algoz dos outros condenados. O juiz ordinário, Alferes João Baptista Cardozo Paz, da Ouvidoria Geral e Correição de Comarcas de São Paulo (Curitiba e Paranaguá), aceita o seu pedido e muda a pena do condenado de galés
perpétua para a pena de morte.
Imediatamente re-recorreu, se assim pode-se dizer, pedindo para ficar com a pena anterior.
O titular da já então 5a Comarca de São Paulo (Curitiba) envia um novo pedido para o Ministério dos Negócios da Justiça no Rio de Janeiro, de onde veio a resposta final, confirmando a pena de morte.
Em 1857 aconteceu a sua decapitação, por determinação do Sr. Presidente da Província, Dr. José Antônio Vaz de Carvalhaes.
Quem não gostou foi o pessoal da Câmara, que perdeu o seu carrasco mais famoso e ainda teve que arcar com as despesas da execução no valor de 20$000 (pelo jeito, já tinha inflação).

Luiz Romaguera Netto, membro da Associação dos Amigos do Arquivo Público do Paraná.


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