Histórias do Paraná - Um mineiro paranaense
Um mineiro paranaense
Maria do Carmo R. Krieger Goulart
"Mineiro bom foi feito para exportação; sófica em casa quem tem defeito de fabricação". Não fosse dita por um legítimo filho das Minas Gerais, essa frase poderia parecer ofensiva.
Na boca de um mineiro que passou a maior parte de sua vida no Paraná, e que gostava da conversa descontraída, das frases de humor e de contar "causos", ela tinha um sabor especial.
Quase cinco anos depois de sua morte (em 18.05.89), o mineiro em questão é homenageado pelo Governo do Estado, Roberto Requião, e pelo Secretário da Saúde, Nizan Almeida Pereira: o Hospital Geral do Portão passa a chamar-se Hospital Mauro Senna Goulart.
Curiosos os caminhos da vida.
Ao chegar a Curitiba, em 1949, não foi recebido por médicos, enfermeiros ou doentes, embora viesse a passar longos quarenta anos como laboratorista do Sanatório Portão.
Em sua mala não havia fórmulas químicas ou tubos para exames.
Havia, sim, chuteiras e camisas dos três últimos times de futebol que havia defendido: Vasco da Gama, do Rio de Janeiro, Grêmio Football Portoalegrense, de Porto Alegre, e Clube Atlético Mineiro, de Belo Horizonte.
Quem o esperava eram os dirigentes do Clube Atlético Paranaense, que o haviam contratado e que depositavam muita esperança em suas pernas.
Se a esperança era muita, o salário era modesto, já que a palavra mordomia era desconhecida do linguajar da época e inexistia como prática nos times de futebol. A rigor, nem se poderia dizer que o futebol era profissional.
Jogava-se por puro prazer e o negócio era completar a renda pessoal com alguma profissão. Aí sim, havia algum privilégio: o jogador que conquistasse a torcida não teria muita dificuldade em encontrar um emprego. E lá se foi o Mauro, com 28 anos de idade e com a cabeça voltada para o futebol, trabalhar num laboratório cuja especialidade maior era verificar e acompanhar os casos de tuberculose.
Foi, gostou e envolveu-se com entusiasmo nesse trabalho meticuloso e exigente.
Prova de sua dedicação foi a declaração, dada alguns anos depois, pelo chefe do Serviço de Pessoal do Departamento de Administração da Secretaria de Saúde Pública, Elianor Muricy: trata-se de "um excelente funcionário, com ótimo acervo de serviços prestados". Um outro depoimento poderia ter sido dado pelas turmas de alunos da cadeira de Tisiologia da então Faculdade de Medicina da
Universidade do Paraná: Seu Mauro os introduzia nos segredos do Laboratório e a admiração que tinham por seus conhecimentos não impedia que crescesse entre eles uma grande amizade. E quantos amigos fez entre funcionários, médicos, alunos e pacientes ao longo de sua vida!
As lembranças de sua infância na cidade natal — Lavras — ficavam cada vez mais longe.
Seu mundo — melhor, sua paixão! — agora era Curitiba.
Sua certidão de nascimento garantia que era mineiro — e isso lhe dava autoridade para brincar: ‘Mineiro bomfoi feito para exportação... " Se houvesse uma certidão especial do seu coração, todos saberiam: seu Mauro era paranaense. E se alguém duvidar, passe agora pelo Portão: lá está o Hospital Geral Mauro Senna Goulart.
Justa homenagem a quem muito amou esta terra e sua gente.
Maria do Carmo K Krieger Goulart, historiadora e escritora
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