quinta-feira, 2 de junho de 2016

Histórias do Paraná - Maiôs de lã

Histórias do Paraná - Maiôs de lã

Maiôs de lã
Rosi Thá Luiz

Lá pelos idos de 1941, as praias de Matinhos, Caiobá e Guaratuba eram freqüentadas pelos banhistas somente no inverno. Não que se tivesse uma especial predileção pelo frio, mas por uma profilática razão.
Acontece que o combate à malária não era realizado, e todos temiam ser picados pelo mosquito transmissor que, ao inocular seus micróbios, se posta de maneira graciosa sobre a pele dos iuautos, realizando passos mágicos de ballet, o que o diferencia dos mosquitos comuns.
Alguns dias mais tarde, uma febre intermitente e renitente se estabelecia e o desventurado, tremendo como São Guido, deveria se submeter a tratamento a base de quinino, que curava a doença, mas estraçalhava com o fígado da vítima.
Havia poucas casas, a luz era de lampião ou petromaques, e somente algumas vendas podiam suprir as necessidades da população móvel.
Em compensação, peixes, camarões e mariscos abundavam.
Os banhos de mar eram engraçadíssimos.
Devido ao frio, mulheres e homens se dirigiam até a praia, bem cedo, vestidos com roupões coloridos.
Os maiôs eram de lã, tecido que esticava após uma ou duas imersões no mar, tomando-se enormes, ficando duas vezes maiores que a silhueta que os envergava.
Era um horror.
Nos pés, ostentavam-se tamancos de sola de madeira, que evitavam ferimentos ao se caminhar pelas ruas revestidas do berbigão dos morros. A cabeça era revestida por toucas de borracha.
Toda a parafernália era deixada próxima às últimas ondas que beijavam a areia. O mar, em geral, apresentava-se calmo, com ondas que rebentavam silenciosamente.
Os banhos eram deliciosos e reconfortantes.
As caminhadas diárias eram obrigatórias.
Formavam-se grupos que iam aos Morros do Farol, do Boi, da Cruz, à Praia dos Amores, das Conchas, etc.
Os rapazes auxiliavam as moças nos trechos mais difíceis de serem transpostos.
Nos dias de lua cheia, todos se dirigiam às pedras para vê-la surgir como que emergindo do mar e derramando luz prateada na vastidão do oceano.
Nas outras, noites, realizavam-se serenatas sob acordes de violão.
A viagem até o litoral era difícil e longa.
Inicialmente, devia-se vencer o trecho pela Graciosa, até o alto da Serra do Mar.
As curvas, uma seguida às outras, deixavam muitos estômagos mareados. A cabeça rodopiava como pião solto da fieira.
Apesar do mal-estar físico, os rostos alegres e empoeirados amainavam a situação.
A expectativa maior era a chegada ao Balneário, hoje Praia de Leste.
Sem estrada, o acesso às praias era realizado pela areia, próximo ao mar.
Se a maré estivesse cheia, o recurso era esperar a vazante ou pernoitar no hotel lá existente.
Telefone não havia, para informar se a passagem estava livre, tinha-se que aventurar.
Todos temiam o percurso, pois os rios que deságuam no mar eram, às vezes, traiçoeiros.
Muitas carcaças de carros e ônibus foram tragadas, testemunho de que o trecho exigia a máxima atenção.
Para chegar a Guaratuba era necessário, ainda, contratar os serviços de canoeiros, e atravessar toda a bagagem em canoas movidas a remo.
A boa vontade, a beleza daquelas paragens, a tranqüilidade encontrada, o contato íntimo com a vegetação, com o mar,
o sol e o ar puro, superavam toda e qualquer dificuldade que se interpusesse entre a cidade e o litoral, entre a terra e o mar, entre o labor e o lazer.

Rosi Thá Luiz de Curitiba.


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