terça-feira, 31 de maio de 2016

Histórias do Paraná - Fábulas indígenas

Histórias do Paraná - Fábulas indígenas

Fábulas indígenas
Luiz Augusto Pierin

"Macaco velho não mete a mão em cumbuca".
Bem velho é esse ditado, nossos avós já o recitavam.
Seu significado, também, não é mistério para ninguém. O que a maioria sequer desconfia é que esse velho ditado foi cunhado em tempos imemoriais pelos índios tupis brasileiros.
Eles pronunciavam algo como: "Kai tuimbaé i pó kuiambuka pupé ndoimondeb'.
A "literatura", por assim dizer, de nossos indígenas era vasta, mesmo com sua característica de iransmissão oral.
Isso incluía os primeiros ocupantes do território que hoje vem a ser o Paraná, principalmente os guaranis.
Algumas de suas lendas - como a da criação cias Cataratas do Iguaçu, por exemplo — são fartamente conhecidas.
Mas suas criações abrangiam, ainda, muitas histórias lipo fábulas, provérbios e trovas -algumas de grande apelo poético.
Diversos antropólogos, lingüistas e outros estudiosos, principalmente nos séculos XVIII e XIX recolheram e compilaram parte da produção literária ou do imaginário dos nossos índios, entre os paranaenses.
Faris Antonio S. Michaele, no seu trabalho "Presença do índio no Paraná" (in História do
Paraná — Coleção Grafipar), destaca, por exemplo, belas fábulas como a da onça e a raposa.
Há muito tempo que a onça queria deitar as patas — e a boca — na ladina da raposa.
Esta, além de ágil, era muito esperta, e sempre escapava da onça.
Até que a onça bolou um plano que julgava infalível para pegar a raposa: fingiu-se de morta. A notícia da morte da rainha da floresta correu a mata, todos os animais apareciam para ver e velar a onça morta.
A raposa perguntou então aos outros animais:
- "A onça já arrotou três vezes?"
Ante a surpresa dos demais animais, a raposa tratou de esclarecer que toda onça, quando morre arrota três vezes.
Ao ouvir a explicação, a onça cuidou de convencer a bicharada toda de que, realmente, estava morta, e arrotou forte três vezes. A raposa, mais que depressa, deu no pé, não sem antes dar uma gostosa gargalhada: "Onde já se viu um defunto arrotar?"
Já a história indígena, da raposa e do jaboti lembra em muito a nossa fábula do coelho e da tartaruga.
Nas duas histórias os bichos apostam uma corrida. Só que, no caso da fábula indígena, o jaboti é muito mais esperto.
Na história indígena, o vencedor da corrida ganha como prêmio o direito de casar com a filha do gavião.
Como é muito devagar, o jabuti pegou sua parentada toda -centenas de outros jabotis iguais a ele - e colocou os bichos em intervalos regulares ao longo do trajeto. E dada a largada e lá se vão a raposa e o jabuti. A raposa dispara na frente, é claro, e volta e meia olha para trás, para se certificar que o jaboti esta longe.
Mas o que vê a raposa? Um jaboti quase nos seus calcanhares. A raposa apressa a corrida, olha para trás e o jaboti continua no seu encalço.
Até que a raposa não agüenta mais, desfalece de cansaço, e o jaboti ganha a corrida.
Para completar, uma trovinha em guarani:
"Ixe, man, guirá mirim!
Xá rekó, man, ce pepó.
Xa bebê ne rakaquera Xapuana ne rekô.
A tradução nos revela uma bela e sutil poesia que nada deixa a dever aos mais sensiveis hai-kais.
A tradução diz: "Se eu fora um passarinho, oh, quem me dera!
Eu teria minhas asas, voaria no teu encalço, e me ergueria ao pé de ti."

Luiz Augusto Pierin, contador aposentado e pesquisador em Foz do Iguaçu


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