Histórias do Paraná - Duas de penitenciária
Duas de penitenciária
Rodrigo Pereira Gomes
A Penitenciária Central do Estado, em Piraquara, eqüivale a uma pequena e efervescente cidade Ela comporta 14 galerias com 1.600 "hóspedes" compulsórios, além de um "motel" interno para encontros íntimos autorizados e uma área de segurança máxima.
Quem quiser conhecê-la bem vai ter que percorrer exatos sete quilômetros de corredores.
Ou então...
Domingo de sol, 10 horas da manhã. Um grupo de presidiários interrompe a animada partida de futebol para prestar atenção no ronco de um motor que se espalha no céu.
Longínquo, até segundos atrás, ele está cada vez mais próximo.
De repente, o pequeno avião ultraleve aparece na linha dos altos muros da prisão, tão baixo que quase roça nas guaritas de segurança.
Todo piloto de aviação que se preza conhece e respeita a lei que impede sobrevôos em baixa altitude em penitenciárias e outras áreas ou edificações consideradas de segurança. O intrépido ás do ultraleve parece desconhecer essa regra, bem como a possível sanção de quem a transgride: ele pode ser abatido em pleno vôo. E por desconhecer tanto uma quanto a outra, nosso piloto começa a dar rasantes em círculo
sobre a penitenciária.
Armado com um mosquetão de alto alcance e impacto, o policial militar que fazia a vigília na sétima guarita ainda questionou o colega da guarita vizinha: - "E daí, cumprimos a lei?" Não esperou pela resposta.
Mirou o motor da pequena aeronave e mandou chumbo grosso.
O ultraleve e seu piloto só não se espatifaram por completo, num morro próximo à Companhia de Guardas, porque a pequena aeronave plaina com certa facilidade, diminuindo o impacto da queda.
Os guardas recolheram o piloto com alguns ossos quebrados e uma incrível explicação.
Tratava-se de jovem promotor público, recém aprovado em concurso e nomeado para atender a Penitenciária Central do Estado.
Naquele domingo de sol, disse, estava apenas tentando conhecer de maneira rápida, fácil e prazeirosa o seu novo local de trabalho.
Se entrar numa penitenciária pelo céu não pode, muito menos é permitido sair dela por baixo.
Mas todo preso tem o direito intrínseco de tentar a fuga - e uma das maneiras mais usuais de se fugir de uma prisão é através de túneis.
Em 1979, um grupo de presidiários de Piraquara se notabilizou pela maior obra de "engenharia fugitiva" já construída ali.
Era um túnel com 78 metros de comprimento, escavado cinco metros solo abaixo.
Iniciava na terceira galeria, atravessava um campo de futebol e um pátio de sol, avançando em direção ao muro externo.
Tinha escoramento interno, luz elétrica, ventilação e carretilha para a retirada da terra escavada.
Para enganar os guardas, a boca do túnel era tapada com um tapume imitando uma parede, colado com massa de feijão.
Deveria dar fuga a cerca de 150 presos de três galerias.
Faltava escavar apenas mais dois metros para chegar ao muro externo, quando se deu o desastre. O "engenheiro" da obra cochilou nos cálculos e elevou o túnel. A camada de solo não agüentou o peso de um caminhão que passou por cima, afundando e revelando a passagem subterrânea.
A frustração deve ter sido grande.
Mas quem garante que um novo túnel não esteja sendo escavado nesse instante?
Rodrigo Pereira Gomes, funcionário público aposentado.
Escreveu baseado em fatos narrados pessoalmente pelo Capitão PM Marco Aurélio de Moraes Sarmento,
precocemente falecido em 04.12.93
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