domingo, 10 de agosto de 2014

Histórias do Paraná - A Revolução no Água Verde

Histórias do Paraná - A Revolução no Água Verde

A Revolução no Água Verde
Pablo Gomes y Monzon

Em breve, vai fazer um século que a revolução federalista viveu a parte mais importante e dramática de seu desfecho em terras do Paraná. A heróica resistência da Lapa, e o cruel assassinato do Barão do Cerro Azul são quase que as únicas referências que hoje se fazem a respeito desse episódio.
Mas tem muito mais história para contar, e até sobrou alguma coisa acontecida aqui no Água Verde, em Curitiba.
Contava o avô de minha mulher, o velho Romédio Dorigo, dos sustos e apuros por que passou naquele tempo, quando, recém chegado de sua Itália natal, veio morar no bairro, mal sabendo falar o português, e não tendo a menor idéia do por quê guerreavam maragatos e pica-paus.
Enquanto a Lapa resistia bravamente ao cerco imposto pelos maragatos de Gumercindo Saraiva, Curitiba, que fora covardemente abandonada pelos defensores pica-paus, já estava em poder dos rebeldes.
Para cobrir os custos da ocupação, os invasores procediam coleta compulsória de comerciantes, fabricantes ou de quem pudessem arrancar algum dinheiro.
Em sua maioria, bandoleiros do Rio Grande do Sul, percorriam a cidade aterrorizando a população com seus métodos.
Coitado daquele que reagisse ou se negasse a contribuir, era de imediato acusado de pica-pau, e em muitos casos degolado ali mesmo, no meio da rua.
O Água Verde aquele tempo era quase que povoado só por imigrantes italianos, que viviam em chácaras onde não haviam nem ruas.
Como eram pobres, os bandidos não os incomodavam.
Mas o ferreiro Romédio, que tinha seu negócio na rua principal, ali onde hoje é o Cicles Água Verde na República Argentina, era uma constante vítima dos achaques.
Ou contribuía, ou era passado o facão, ameaçavam os gaúchos.
O domínio dos maragatos não durou muito.
Graças à ferrenha resistência do General Carneiro e seus soldados na Lapa, os rumores da guerra mudaram, e eles tiveram que fugir para o sul.
Mas foi ainda pior, segundo o velho Dorigo, pois os vingativos pica-paus (tropas do governo sob o comando do General Everton de Quadros), ao retornarem à cidade, iam de casa em casa, e acusavam de cúmplices os que tivessem contribuído com os revolucionários.
Quando comprovada a acusação, a critério deles, é claro, a pena era o fuzilamento.
Foi o que aconteceu com o Barão do Serro Azul, Mato Guedes, e muitos outros paranaenses ilustres.
Numa das vezes em que esses milicos foram importuná-lo em sua ferraria, contava o velho Romédio, então um jovem e corpulento ferreiro, já com os nervos à flor da pele pela constante tensão, teve uma estranha e inesperada reação.
Parecia, disse, que o espírito revolucionário de Garibaldi se lhe tinha encarnado, e fez ferver o seu sangue de italiano, já quente por natureza.
Pois passou a mão numa marreta, e saiu em direção aos apavorados soldados, dando marretadas a esmo e gritando com aquele sotaque que alguns mais velhos ainda tem no Água Verde: "Io non xo maragato ne pica-pau, oxtia, io xo picafero... io xo picafero... io xo picafero..." Os pica-paus deitaram a correr e nunca mais voltaram, e o Romédio Dorigo, por precaução, também passou um bom tempo escondido.

Pablo Gomes y Monzon, micro-empresário


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