sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Histórias do Paraná - Os congressos do centenário

Histórias do Paraná - Os congressos do centenário

Os congressos do centenário
Tito Moreira Salles

Desembarquei em Curitiba, no dia 2 de janeiro de 1953. As festas de reveillon impediram-me de inaugurá-la no primeiro dia do ano.
Esta cidade estava em plena euforia das comemorações do primeiro centenário da emancipação política.
O governo mandava emitir uma espécie de selo, com dizeres alusivos e com um clichê retratando prédios e paisagens locais.
Hoje, uma folha dessas constitui raridade.
Lem-bro-me que um deles trazia o Hospital São Lucas. O remetente de qualquer carta colava um destes selos no verso do envelope e fazia, dessa maneira, uma propaganda eficaz e informativa.
Havia também os congressos.
Congressos de tudo, de jornalistas, de farmacêuticos, de folclore, de psicologia, de veterinária, etc.
Até parecia que os organizadores de todos os congressos realizados no Brasil, nesse ano, tinham escolhido Curitiba como sede.
Ora, a estudantada logo percebeu que todo congresso tinha seu dia de enceramento e, o melhor, ao final de cada sessão solene de encerramento sempre vinha uma "boca livre". Podia ser coisa simples, com salgadinhos e chope, para os congressos estudantis, ou um sofisticado bufet para os congressos de maior relevância.
Bastava, pois, seguir o noticiário dos eventos e, no último dia, envergar a fatiota para filar um coquetel.
Depois das primeiras doses sorvidas, o ambiente até se tornava de franca cordialidade.
Uma semana, em agosto, foi o Congresso dos Reitores.
Encerramento com toda pompa e circunstância no auditório do Colégio Estadual do Paraná, enorme prédio, novinho em folha.
Foi uma soleníssima sessão, que o governador Bento Munhoz da Rocha fechou com admirável discurso, grande orador que era, onde comparava o desenvolvimento do Norte do Paraná, com a época da expansão da Inglaterra no tempo da rainha Vitória.
Bento cativou público e reitores, foi aplaudidíssimo.
Terminada a cerimônia magnífica, passou-se à mesa do coquetel.
Os já tarimbados "perus" de congresso lá estavam, é claro.
Mas dessa vez ficaram meio acanhados de se aproximar de tão ilustres figuras.
Ao mesmo tempo, porém, o champanhe francês - champanhe francês mesmo! - e as finas iguarias traziam apelos irrecusáveis.
Na indecisão do acanhamen-to, porque os terninhos estavam surrados, a gravata puída e o lustre forçado do sapato pedindo aposentadoria, apareceu o governador em pessoa.
De relance, ele percebeu o que se passava.
Então num gesto de superior liberdade, convidou-nos e insistiu para que nos servíssemos.
Nunca um champanhe e acepipes couberam tão bem.

Tito Moreira Salies, médico.


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