sábado, 29 de outubro de 2016

Histórias do Paraná - A inauguração da Praça

Histórias do Paraná - A inauguração da Praça

A inauguração da Praça
Marino Braga

Esta história aconteceu em Ponta Grossa, há mais de 30 anos.
Era época de eleição. A lei proibida, e ainda proíbe, a realização de comícios eleitorais desde três dias antes do pleito. O prefeito da cidade, um valoroso líder político da região princezina, Sr. Juca Hoffmann, marcou a inauguração de uma praça justamente para um dia antes. A eleição era num domingo e a inauguração da praça no sábado à tarde.
Eu e o outro juiz eleitoral da comarca, entendendo que a inauguração outra coisa não seria senão um disfarçado comício, proibimos a sua realização.
Estabelecemos, com isso, uma acentuada divergência nos meios políticos locais.
De um lado, os lideres dos partidos de oposição, apoiando a medida.
De outro, o prefeito com a sua corte, lutando pela revogação.
Era démarche pra cá, démarche pra lá, saí não sai a inauguração, um tormento para todos os interessados.
Próximo ao dia das eleições recebemos , no fórum, a visita do prefeito.
Reiterou ele o entendimento de que a inauguração da praça era apenas uma cerimônia cívica, não um comício eleitoral.
Pediu, incisiva, mas respeitosamente, que deixássemos sem efeito a proibição.
Afirmou que não permitiria de nenhuma forma que a inauguração se transformasse em comício.
Sopesando os prós e os con-tras, e levando em consideração que o prefeito era um homem de palavra, resolvemos que a inauguração poderia ser feita, desde que fosse apenas isso, não um comício eleitoral.
Contudo, sem nada dizer ao chefe político, resolvemos, também, nos precatar contra uma eventual desobediência e estabelecemos o nosso plano de ação, que acabou desnecessário.
Pouco antes da hora marcada fomos para a praça os três Juizes de Direito da Comarca (os dois eleitorais e outro que nos apoiou em tudo) e levamos conosco um funcionário do fórum entendido em eletricidade.
A praça regurgitava de tanta gente.
Colocamo-nos no meio do povo, em posição estratégica.
Se alguém falasse em eleição, em candidatos, em partidos políticos, o microfone seria desligado, inviabilizando, assim, a transmissão do discurso para os alto-falantes, e nós os juizes subiríamos ao palanque e acabaríamos com a festa.
Mas não foi preciso nada disso, pois o Sr. Juca Hoffmanm cumpriu rigorosamente com o prometido.
Num breve pronunciamento enumerou as obras que já realizara na cidade, disse que aquela era uma das mais importantes, e declarando inaugurada a praça deu por encerrada a solenidade.
Respiramos aliviados, mas mesmo assim levamos um pequeno susto.
No palanque, dentre tantas outras pessoas, estava um entusiasta correligionário do prefeito, um ilustre advogado pontagrossense, conhecido por suas qualidades e também por ser muito tinhoso.
Quando o Sr. Juca Hoffman deu por encerrada a solenidade, dirigiu-se ele, ostensivamente, ao microfone.
Mas o prefeito, conhecendo-o muito bem e sabendo do que era capaz, agiu rápido.
Passou a mão no microfone e dirigiu-se novamente ao povo: A praça esta inaugurada! A praça é vossa! Fazei uso dela! E dito isso desceu do palanque trazendo consigo o tinhoso correligionário e toda a sua corte.
Tudo se passou de acordo com o previsto e o desejado. A justiça eleitoral, sem alardes, cumpriu com o seu dever. O prefeito, com ombridade, cumpriu com a sua palavra.
Mas ninguém ficou sabendo do nosso não realizado plano de ação, que só agora está sendo revelado nestas oportunas "Histórias do Paraná".

Marino Braga, Desembargador e Membro do Centro de Letras do Paraná


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