sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Histórias do Paraná - Será o Benedito?

Histórias do Paraná - Será o Benedito?

Será o Benedito?
Benedicto Bueno

De um preto que azulava aos reflexos da luz, era o próprio Bendito.
Vistoso, espadaúdo, um Apoio de ébano.
A tanto garbo e pompa, acresça-se: - o nosso Bené não tinha pendor algum para o trabalho.
Simplesmente o abjurava.
Jamais soube o que fosse um "bon vivant", mas foi o melhor dentre todos.
Uma bóia filada aqui, uma fatiota abiscoitada mais adiante, e assim caminhava o nosso pretinho, despreocupado.
Quando o doce "farniente" da Lapa minguava, o Dito sumia da cidade.
Tempos empós, ei-lo de volta: - roupas novas, sapatos de verniz bico fino e, às vezes, até uma gravata de cores incríveis, ressaltando o inefável de sua feiurice.
Tais paramentos, havidos sabe Deus onde, eram usados, sem revezamento, até que os sapatos rompessem, a camisa puísse, o ter-ninho roto se tornasse. O negro ficava um andrajo só, mas não perdia a pose.
Continuava hilário, azul, apolíneo e despreocupado.
- Seria o Benedito um guri abandonado, criado na rua?
- Não.
Era um dos muitos filhos de nhá Jesus e nhô Migué. Fosse trabalhador, como o pai, e teria sido, no mínimo, excelente jardineiro.
Enjoado de vigarices comuns, Benedito descobriu quão lucrativo o fingir-se de mudo.
Comeu e bebeu, algum tempo, por conta de tanto.
Nos ditos dourados anos cinqüenta, pari-passu às aventuras de nosso histrião, se alastrava, no sul, a fama de milagreiro de um menino chamado Wilmar.
Wilmar Schmidt.
Enquanto este fazia milagres, curava, devolvia o dom da fala, recuperava desenganados, o nosso Benedito, magistralmente, ocultava sua prodigiosa loquacidade em gestos e grunhidos de fazer dó.
Um dia, Bené cansou de sua mudez.
Recomeçou a falar, e falando estava na estação de Engenheiro Bley, a caminho da Lapa, quando um polaco, dele se aproximando, inda-gou:
- Você, por acaso, não é o mudo a quem, volta e meia, hospedo lá em casa?
- Acertou.
Em carne e osso, sim senhor.
- E como explica essa tagarelice toda?
- Ora! Meu amigo!... e o menino milagroso não vale nada?
Foi, do Bena, a última façanha.
Depois desta, nunca mais dele se teve notícia.
Pena! Uma grande pena! Pois, ainda que exornado de qualidades não mui ortodoxas, Benedito era um homem bom.

Benedicto Bueno, tabelião aposentado na Lapa


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