sábado, 9 de abril de 2016

Histórias do Paraná - Mão Negra e os bicheiros

Histórias do Paraná - Mão Negra e os bicheiros

Mão Negra e os bicheiros
Rodrigo Pereira Gomes

No início deste século, durante pouco mais de dois meses do segundo semestre de 1909,
os jornais da então mais que pacata Curitiba ocuparam-se de um estranho personagem, a quem apelidaram de "A Mão Negra". O sujeito, segundo o "Diário da Tarde", tinha "o feio hábito de entregar-se a escrever missivas anônimas". Eram, ainda segundo o jornal, "cartas ameaçadoras" endereçadas "a vários comerciantes desta praça".
Que ameaças eram essas? Quais eram os comerciantes ameaçados? Curioso, essas perguntas em momento algum foram respondidas pelo "Diário" ou outro jornal qualquer da provinciana Curitiba.
Os nomes dos ameaçados já corriam de boca em boca entre a população, a cidade não falava de outra coisa.
Os jornais ainda sim, preferiam gastar papel em catilinárias quase diárias contra o "pândego das cartas anônimas que vem sobressaltando diversos comerciantes". Nada porém de revelar seus nomes.
Por quê?
A resposta fica sugerida em algumas outras notícias a respeito das façanhas do "Mão Negra". No final de outubro daquele ano, uma das cartas do famigerado personagem caiu nas mãos do chefe de polícia. A carta, segundo os jornais, denunciava a existência na cidade de diversos banqueiros do jogo do bicho, já então praticado ao arrepio da lei, sem contudo citar-lhes nomes. (Não seriam eles os mesmos respeitáveis cidadãos curitibanos que estavam sendo ameaçados?)
Os jornais dessa época também nos dão conta que "Mão Negra", em outra carta enviada semanas antes ao Dr. Costa Carvalho, figura bastante conhecida na cidade, avisava que um sueco de nome Rytling, sem familiares na cidade, haveria de se suicidar por causa do jogo do bicho. O que, destacava o "Diário da Tarde", "acabou realmente por se confirmar, com a horrível auto-eliminação do sueco Rytling na Praça Osório".
Mas surpreendente, mesmo, é que o jornal não tenha desconfiado
— ou não quis desconfiar — que o sueco, em vez de suicidar-se, tenha sido "suicidado". Afinal como pode alguém saber antecipadamente que um determinado sujeito vai se suicidar semanas depois? O chefe de polícia, suspeita-se, bem que desconfiou, mas preferiu fazer de conta que a bronca não era com ele.
Toda essa história acabou de forma tão misteriosa como começou.
De um dia para o outro, os jornais simplesmente deixaram de falar
no "Mão Negra" e em suas cartas ameaçadoras. E o assunto acabou por esquecido em pouco tempo.
O mais provável é que os "respeitáveis comerciantes da praça de Curitiba" que estavam sendo ameaçados, na verdade metidos com a jogatina proibida, resistiram o quanto puderam às tentativas de achaque do misterioso "Mão Negra". Isso até receberem o duro recado do "suicídio" do sueco.
Então, amedrontados, pagaram ao achacador, e a história do "Mão Negra"acabou por isso mesmo.
Se não foi assim, o que afinal teria se passado nesses pouco mais de dois meses de 1909 na (quase) pacata cidade de Curitiba?

Rodrigo Pereira Gomes, de São José dos Pinhais, funcionário público aposentado.


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