Histórias do Paraná - A Primeirona
A Primeirona
Roberto de Souza Brandão
Atentem para a escalação deste timaço: Hauer, Labusch e Dietrich; Iwersen, Iusksch e Theo Obladen, Kastrup, Maschke, Leo Obladen, C. Shlemker e Fritz Essenfelder.
Até parece a seleção alemã que levou a Jules Rimet na copa de 1954. Na verdade, trata-se dos onze saudáveis jovens curitibanos que, longínquo 24 de outubro de 1909, um domingo, disputaram como os "Ingleses" de Ponta Grossa a primeira partida de futebol interclubes realizada no Paraná. Com esses nomes, não era estranhável que fossem mais conhecidos como os "Alemães". Daí que algum gaiato até pode dizer que a primeira partida de futebol no Paraná foi internacional, Ingleses X Alemães.
Os "alemães", como se diz no jargão esportivo, defendiam as cores do glorioso "Turnverein" que, pouco tempo depois, se transformaria no não menos glorioso "Coritiba Foot-Ball Club". Vem dessa época seu apelido de "Coxa Branca", por razões que parecem óbvias, embora o apelido de "Coxa Rosa" também não lhe caísse mal.
Já os pontagrossenses, apesar de mais conhecidos então como "os ingleses", tinham uma folgada maioria de jogadores brasileiros de certidão e nome.
Na histórica primeira partida, ou "match" como se dizia então, eles foram a campo com Ayres, Frederico e Debu; Charles Wright,Joca e Maravalhas,J. Dawes, Monteiro, Silva Jardim, Flávio Guimarães e Salvador.
Alem de jogar em casa, no "ground" do Alto do Cemitério, os pontagrossenses ainda levavam a vantagem de ter o "referee", vulgo juiz, o inglês Magnus Flygare, funcionário da American S. Brasilian Engineering Ca, empresa encarregada de construir a ferrovia que ligaria o Paraná a São Paulo e ao Rio Grande do Sul.
Mas é maldade pensar que o "team" pontagrossense venceu o embate, por um gol a zero, graças a essa vantagem.
O "team" curitibano perdeu, ou deixou de ganhar, por puro azar, sabe como é. Futebol é uma caixinha de surpresas... Pelo menos é isso que sugeriu uma testemunha privilegiada desse primeiro match futebolístico, o repórter Aldo da Silva, do "Diário da Tarde": "Os Teutos (ou seja, os Alemães) desenvolveram no segundo tempo um ataque enérgico e se não conseguiram marcar pontos devem simplesmente ao não conhecimento do terreno e ao acaso", escreveu Silva na pormenorizada reportagem que o "Diário da Tarde" publicou dois dias depois, na primeira página.
Nela, sobram elogios desbragados, também para o primeiro cartola coxa, o presidente do "team" Frederico Rummert, além de descrições do tipo: "as arquibancadas do Foot-ball Club Ponta-grossense estavam repletas de espectadores que se derramavam pelos lados do campo, e todos pareciam ansiosos para ver o início do match..."
Embora não se saiba de outros repórteres que, em jogos posteriores, tenham atribuído a derrota de uma equipe ao desconhecimento do campo - afinal todo campo de futebol é praticamente igual: retangular, com medidas fixas, gramado e dois conjuntos de traves — o atilado Aldo Silva fez escola na nossa crônica esportiva.
Pois foi como convidado especial de um dos clubes, o Turnverein, que ele cobriu a partida de estréia do nosso futebol.
Nessa condição ele viajou para Ponta Grossa, hospedou-se no melhor hotel da cidade, foi a jantar e baile — tudo na mordomia. E até hoje, dizem não há coisa que um cronista esportivo goste mais que uma bela mordomia.
É bem verdade que Aldo Silva não estava só. Também incorporado à delegação do Turnverein como convidado especial estava o repórter Luiz Schlemker, do "Der Beobaether", informativo da colônia alemã em Curitiba.
Mas esse, como apenas seus patrícios entenderam o que aconteceu, a historia acabou por absolver.
Roberto de Souza Brandão, comerciante em Curitiba
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