segunda-feira, 4 de abril de 2016

Histórias do Paraná - Os sonhos de Rossi

Histórias do Paraná - Os sonhos de Rossi

Os sonhos de Rossi
Valêncio Xavier

Giovanni Rossi foi o único cara que, antes do tempo, viu o Paraná no século XX. Um Paraná bem diferente do de hoje, neste final de século: em crise como todo o Brasil, com sua inflação a prova de choque.
Médico-veterinário, agrônomo, ativista anarquista, nascido na Itália, Rossi foi o criador da tão pouco estudada Colônia Cecília, comunidade anarquista implantada em 1890, no Paraná, por imigrantes italianos.
Da Colônia Cecília dizem tantas besteiras como a que fora Dom Pedro II quem doara a terra para os anarquistas praticarem, entre outras coisas, o fim da monarquia. O próprio Rossi desmente: as terras, a 18 quilômetros ao sul de Palmeiras, "com 10 km2 de campos e bosques compramos ao preço de 15 libras o hectare pagável a prestações".
A Colônia Cecília, que chega a ter cerca de 200 habitantes, se extingue em 1893. Várias tm sido as explicações sobre seu fim: dificuldades financeiras, perseguição governamental pelos colonos terem aderido à Revolução Federalista.
Ou explicações tão bestas como a que, escandalizadas pelo amor livre ali praticado, as famílias fugiram antes que traçassem suas virginais filhi-nhas.
Mas a explicação certa é o próprio Rossi quem dá: "o nosso pequeno mundo anárquico era muito pequeno e, por isso, muito pobre para assegurar o pão branco, a garrafa de vinho, a entrada para o teatro, a cama macia, a companheira para o amor.
Ao contrário da retórica dos poetas, preferimos as rosas da escravidão aos espinhos da liberdade".
Com a dispersão da Colônia Cecília, Rossi monta uma fabriqueta de bebidas, em Curitiba.
Fracassa e vai para Santa Catarina trabalhar em sua profissão.
Em 1907, volta para a Itália, onde morre em 1943.
Em 1895, escreve "O Paraná no Século XX", livro que faz uma novela de ficção científica, "Visão de Bêbado Contada por ele Mesmo". Na novela, numa sessão espírita, o espírito do Dr. Grillo (médico em Palmeiras) relata que em 1950, o Paraná vive grande progresso sob o regime anarquista.
Tem 20 milhões de habitantes, 4/5 deles imigrantes.
Suas linhas férreas cobrem todo o estado e alcançam o Pacífico. A ecologia é preservada. O centro do progresso é a cidade de Elettropoli, que se ergue em meio ao Parque Nacional de 7 Quedas, que não foram destruídas.
Eis um trecho desse livro inédito de Giovanni Rossi por mim traduzido:
"Elettropoli, fabulosa cidade de 500 mil habitantes, que se ergue perto das Sete Quedas, não é famosa apenas pelas milhares de turbinas hidráulicas submersas de uma margem a outra do rio, para alimentar enorme bateria de milhares e milhares de dínamos fornecedores de energia e eletricidade a todo Paraná... tem fama mundial por seus laboratórios eletrotécnicos e suas fábricas... produzem todo material da iluminação, da rede telefônica e de aparelhos fonográficos... maquinaria aperfeiçoada, multiplica os resultados industriais, reduzindo o trabalho dos operários... novas descobertas como a transmissão a cores de imagens em movimento... Elettropoli é o templo sagrado da ciência, vanguarda de todo progresso futuro".
Pena que não se cumpriram os sonhos de Giovanni Rossi.

Valêncio Xavier é escritor e historiador.


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