terça-feira, 19 de abril de 2016

Histórias do Paraná - Usina de apelidos (I)

Histórias do Paraná - Usina de apelidos (I)

Usina de apelidos (I)
Luiz Geraldo Mazza

Wilson Rio Apa, jornalista e escritor, chega em Paranaguá na estação ferroviária com a sua mulher, Estér, e os filhos Kim e Thor.
Com sua barba indiana, aquele ar de permanente aventura às vezes tangendo para o budismo, era conhecido por suas façanhas marítimas ao percorrer a costa com um frágil veleiro ou ao testar sua resistência física, sem alimentação, numa das ilhas da baía.
Usando roupas modernas - e Paranaguá era o ponto focal dessas inovações, porque elas surgiam primeiro no litoral e depois subiam a serra, até meados dos anos cinqüenta — e um clássico "jean sablon", o blusão caído sobre as calças, que na cidade imediatamente apelidaram de "caga em pé", Wilson era o nosso Jack London, o que rompia com as acomodações urbanas, e enfrentava o desafio do mar, como fez logo após formar-se em Direito, ao pegar um cargueiro estrangeiro no qual fez uma série de reportagens, cheias de reflexões filosóficas em torno da condição humana, para "O Estado do Paraná".
Pois Wilson e seus familiares tratavam do desembaraço das cargas, quando um dos "chapas" da estação ferroviária discute de quem era a sacola de viagem.
Um outro emenda:
- E de Jesus Cristo em feridas...
Verdadeira ou folclorizada, a passagem dá bem a idéia de Paranaguá como uma usina de apelidos, característica que foi perdendo com as transformações urbanas e a chegada da gente de outras partes do país, da febre cafeeira até a diversificação da pauta de exportação do porto.
Na cidade havia um promotor público, popularíssimo, que padecia de um mal estranho: costumava, em meio às madrugadas, nas rodinhas de boêmia, dormir em pé. Foi o que bastou para que o chamassem de "cavalo de padeiro". O apelido é perfeito na medida em que a cada parada da carrocinha de pão, referência desaparecida praticamente de cidades de médio porte, o cavalo puxava o merecido sono e saía com dificuldades, meio sonâmbulo, para a retomada do trabalho.
Uma pena que tenham desaparecido os textos sobre esse compulsivo hábito dos parnanguaras, um dos quais publicado no jornal "Diário do Comércio" durante as festas do tricentenário da cidade.
Alguns dá para lembrar, como "olho de pedir pão" para um sujeito humilde, súplice; "cara de areia mijada", para quem é portador de bexiga ou tem o rosto excessivamente perfurado, ou ainda "reboco de igreja velha" quando o estrago estético é maior. \
O Chiquinho Deliberador, ex-prefeito de Ibiporã, ao assumir o Porto de Paranaguá percebeu a rapidez com que surgem apelidos: por causa do defeito que tem num dos olhos foi chamado de "olho de garopa"; e o general Alípio Ayres de Carvalho, um dos implantadores do planejamento no Paraná, por sua visão multidisciplinar, ao tratar com intimidade de todos os assuntos, se transformou em "professor de Deus".

Luiz Geraldo Mazza é jornalista.


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