sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Histórias do Paraná - Falta alguém no Panteon

Histórias do Paraná - Falta alguém no Panteon

Falta alguém no Panteon
Túlio Vargas

Ao contrário do Panteon dos Heróis, levantado na Lapa, cujos nomes estão registrados perpetuamente, houve outras figuras intimoratas durante a invasão federalista, cujos feitos audazes ficaram no esquecimento.
Quando em janeiro de 1894 as tropas de Gumercindo Saraiva iniciaram o cerco ao povoado de Tijucas do Sul, o comandante da praça coronel Ismael Lago, determinou a retirada das mulheres dos soldados.
Estas resistiram à ordem, propondo-se a lavar roupa e prestar outros serviços domésticos.
Foi em vão. O chefe militar proibiu a presença delas no acampamento, mandando-as para Curitiba.
Uma exceção fora feita em favor da mulher de um sargento do 5o Batalhão de Engenharia.
Nas suas memórias de Revolução, Cândido Muricy descreve que ela "era uma mulata forte, de notável atividade, guiava uma carrocinha de duas rodas puxadas por um burro grande e que, por isso, era empregada na condução de coisas do hospital.
Todos a conheciam por Maria, a "Cantineira". A princípio ocupava-se, também, da lavagem de roupas de algumas oficiais.
Depois tornou-se a melhor e a mais solícita enfermeira que podíamos desejar.
Mulher decidida que, mais tarde, durante os terríveis combates, de revólver em punho, desafiando as balas inimigas, ajudou a socorrer os feridos e a conduzi-los da linha de frente para o hospital de sangue, onde várias vezes auxiliou os médicos nos curativos, preenchendo, também, espontaneamente a função de cozinheira dos doentes."
Muricy lembra ainda que foi ela a primeira a dar o alarme da aproximação da vanguarda revolucionária, atentos aos mínimos movimentos que se processavam na mataria das baixadas.
Veio gritando, espavorida: "Esta aí o inimigo! Preparem-se! Já estão brigando com a guarda que vem fugindo..." O tiroteio crescia e os primeiros sinais do ataque prenunciava a tempestade bélica.
"A violência da arremetida indicava a certeza que o inimigo tinha da vitória." Maria não se atemorizou como o volume das hostilidades.
Dividia-se na atenção e nos cuidados aos feridos que tombavam sob a fuzilaria. E, quando podia, municiava nas linhas de frente as posições de defesa. A desproporção entre as forças rebeldes e legais, aquelas em maioria esmagadora, demonstrava a inutilidade da resistência.
No dia 19 de janeiro deu-se a capitulação, quando Curitiba e Paranaguá já se encontravam em poder dos federalistas.
Nada mais se escreveu sobre a Maria "Cantineira". Não se sabe se sobreviveu à feroz batalha.
Que fim levou? Não recebeu condecorações, nem o reconhecimento de um registro nos boletins militares.
Mistura de Maria Quitéria, Ana Néri e Anita Garibaldi, ela faz parte daquela legião de desconhecidos que fazem a história no anonimato, sem esperar recompensa.
Sua proeza merece uma investigação mais profunda dos estudiosos da Revolução para que se lhe resgate a memória e se pratique justiça ao seu heroísmo, como anjo tutelar que foi.

Túlio Vargas, ex-deputado e membro da Academia Paranaense de Letras

Fonte: 300 e Tantas Histórias do Paraná, Brasil.

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