Histórias do Paraná - A lâmpada indulgente
A lâmpada indulgente
Marçal Maciel de Araújo
Foi lá pelos idos de 43-44. Há cinqüenta anos atrás.
Vivíamos em clima de excitação. Lá longe, uma guerra se propagava, e da qual nós participávamos. Tínhamos uma Força Expedicionária lutando na Itália.
Estávamos aqui todos contagiados pelo ardor cívico, embalados pelos hinos patrióticos.
Mas era preciso uma conscientização geral da realidade que a todos contagiava.
Acompanhávamos passo a passo o desenrolar da luta. O radio não cessava de transmitir os seus boletins, dando conta do fragor da luta em todas as frentes de batalha.
Os dias, os meses vão passando, e todos nós vamos assimilando a idéia em potencial, o significado do que está acontecendo no mundo. Nós também estamos comprometidos com esta causa que envolve toda a humanidade.
Acordamos para este momento que vai se precipitando. Já agora estamos amadurecidos e damos o passo a frente.
Por que não? Vamos entrando para a História.
Um povo jovem cheio de energia vai se lançando a luta.
Também nós, aqui em casa, somos convocados, urge que façamos alguma coisa, algo que já está sendo feito lá no teatro da guerra.
Precisamos estar preparados para qualquer surpresa.
As autoridades providenciam e a data é marcada. O plano vai ser executado. A Rádio Clube PRB-2 a posto transmite todo o esquema do serviço. E rápido.
Na hora aprazada a Cidade entra em Black-out completo.
Com recomendação rigorosa, severa, que todas as luzes fossem desligadas. O inimigo sobrevoando a Cidade, na calada da noite, e não podendo vê-la, vai-se embora. — Curitiba há cinqüenta anos atrás era bem menorzinha. A B-2 transmitia todo o programa elaborado pelas autoridades. E quando o nosso prezado locutor Wilson vai em frente, dando todos os detalhes do plano deflagrado, apontando aqui e ali alguns focos de luz inadvertidamente acesos.
Eis que surge no "painel" a lâmpada da Capela do Santíssimo, da Catedral. O ambiente nervoso que dominava aquela noite (histórica) levou o nosso combativo Wilson a reclamar que aquela lâmpada votiva (também) fosse apagada.
Eu morava no prédio ao lado da Catedral, e lá da sacada presenciei este momento. E nesta hora aparece solícito, apressado, o sacristão Isidoro Canestraro, para abater a luz do Santíssimo.
Era necessário a comunhão de todos. E assim, a pequenina lâmpada do Santíssimo, que a tradição religiosa determina sempre ficar acesa, naquela noite se apaga, obediente aos reclamos da locução
Na noite escura como breu, nem mesmo o piscar de um perdido vagalume.
Marçal Maciel de Araújo, aposentado do INSS
Fonte: 300 e Tantas Histórias do Paraná, Brasil.
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