sexta-feira, 18 de julho de 2014

Histórias do Paraná - Beau Gest frustrado

Histórias do Paraná - Beau Gest frustrado

Beau Gest frustrado
Haroldo Frota

O ano de 1963 transcorria calmo e tórrido.
Calmo para nós, jovens de 18 anos, que ainda não nos dávamos conta das inquietações políticas que culminaram na revolução de 64, e tórrido no sentido literal, mercê de uma estiagem prolongada e dos imensos incêndios florestais que assolavam o Estado, tornando Curitiba ainda mais cinzenta.
Piolli, como eu, era recruta na saudosa 5" Companhia do Quartel General, sediada no velho quartel da Rui Barbosa, hoje misto de terminal de ônibus e mercado persa.
De família abastada, era do tipo folgazão e um tanto avesso a rigorismos de conduta, muito embora fosse uma pessoa boa e responsável, fato que me levou a elegê-lo como amigo.
Eu, por meu turno, tinha algumas manias não muito condizentes com a idade.
Atravessava a rua na faixa, gostava de música clássica, não pisava na grama e não jogava lixo no chão, dentre outras coisas.
Findo o Treinamento Militar, e logo após o Rancho (almoço), nossa missão era nos deslocarmos ao Quartel General da 5* Região Militar, que na época ocupava o prédio hoje conhecido como O Solar do Barão, onde desempenhávamos atividades diversas.
Piolli era motorista e eu funcionava como revisor do Boletim Diário editado pelo QG, fazendo as vezes de um Sub-Tenente cujo nome já esqueci.
Um certo dia, recebemos tangerinas como sobremesa do almoço, e imediatamente iniciamos a caminhada até o Quartel, onde nosso expediente começava meia hora depois.
Fui descascando minha fruta e guardando as cascas na mão, para jogá-las na primeira lata de lixo que encontrasse.
Piolli, como sempre irreverente, ia jogando cascas pra tudo quanto é canto, deixando um rastro na calçada, o que naturalmente mereceu minha censura, já que nossa amizade me permitia essa liberdade.
Quando chegamos na Rua XV de Novembro, e Piolli já tinha jogado no chão todas as suas cascas, indiferente aos meus reclamos, avistei uma daquelas latinhas de lixo suspensas em poste de luz, que então eram feitas de lata.
Era exatamente o que eu precisava.
Orgulhoso do meu "Beau Gest", e ávido por dar um bom exemplo ao meu "porcolino" amigo, aproximei-me da lata de lixo e, teatralmente, ali depositei as cascas que mantinha na mão.
O efeito não poderia ter sido mais desastroso. A maldita lata de lixo, enferrujada, estava já sem fundo e as cascas, obviamente, espalharam-se todas pela calçada, fazendo meu companheiro se contorcer de tanta risada.

Haroldo Frota, bacharel em Direito


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