Histórias do Paraná - São Tomé andou por aqui
São Tomé andou por aqui
Marina Martins Gouveia
Isso mesmo. São Tomé, o apóstolo que num primeiro momento duvidou da ressurreição de Cristo, andou por aqui.
Aqui mesmo, no Paraná. E em vida.
No século XVII, nenhum cristão vivente por estas plagas ousaria duvidar disso.
Afinal, foram os próprios pregadores jesuítas que se encarregaram de difundir a informação, logo transformada em verdade de fé. Os Padres até descreviam em detalhes o roteiro seguido pelo santo no território que hoje é o Paraná, as florestas que venceu, a caverna onde descansou, o rio em que saciou sua sede.
O jesuíta José Cataldino, por exemplo, numa narrativa de 1613, nos conta que São Tomé deixou seu rastro nas cabeceiras do Rio Piquiri, e também andou pela região de Guaíra e na foz do Iguaçu, onde pregava aos índios (o que pregava ele não diz), postado no penhasco mais alto das cataratas.
Isto, vale ressaltar, há quase dois mil anos, quinze séculos antes, portanto, do descobrimento do Brasil pelos portugueses.
Como o santo viajou da Palestina, onde vivia, até aqui foi um mistério por muitos e muitos anos.
Ele poderia ter se transportado milagrosa e instantaneamente, afinal era santo.
Mais recentemente, porém, o folclorista e crente Heitor Moniz dedicou-se a traçar os possíveis itinerários do santo desde o oriente até esta Terra de Santa Cruz.
Seriam três os possíveis caminhos, sustenta Moniz.
Os dois primeiros, atravessando o Atlântico, incluem uma passagem pela misteriosa Atlântida, o continente desaparecido. O terceiro, um roteiro do ocidente para o oriente, inclui passagens pela Ásia, Sibéria, estreito de Behring, Alasca, América do Norte e Central e, finalmente, o Brasil.
Qualquer que tenha sido o caminho, garante Moniz, "o reide do discípulo de Jesus terá sido o maior que se registra na história da humanidade."
Obviamente, São Tomé não esteve apenas no Paraná em sua passagem por terras brasileiras.
No nordeste se acredita que o santo também andou por lá, e em Pernambuco há marcas em pedra reverenciadas como pegadas indeléveis do santo.
Mas foi aqui, no Paraná, segundo pregavam os jesuítas, que lhe estava reservada uma missão vital.
Teria sido São Tomé quem apontou aos índios guaranis as propriedades nutricionais da erva-mate, ou "caá-Icira", bem como ensinou o seu modo de preparo.
Daí porque até hoje São Tomé é o protetor da erva-mate, que sustentou o primeiro grande ciclo econômico do estado.
E, sem dúvida, uma bela história essa que os jesuítas contavam.
Na verdade, soube-se tempos depois, os padres apenas se apropriaram de uma lenda indígena com o intuito de mais facilmente evangelizar os guaranis.
Pela lenda original, foi um enviado do próprio Tupã, chamado Zumé, quem ensinou aos índios o preparo e consumo do mate.
Zumé virou Tomé, o enviado do novo Tupã que os jesuítas vinham anunciar. A adaptação funcionou.
Apesar de nada original.
Marina Martins Gouveia, de Toledo, professora aposentada e pesquisadora
Nenhum comentário:
Postar um comentário