terça-feira, 15 de julho de 2014

Histórias do Paraná - A fera que andou por aqui

Histórias do Paraná - A fera que andou por aqui

A fera que andou por aqui
Marcelo Oikawa

Atraído pelas histórias de sangue, coragem e pioneirismo, ele passou pelo Norte do Paraná nos anos 40.
Era quase um moleque, daqueles que passavam os dias nas praias, na capital do Brasil.
Seu pai, um advogado do Rio, tinha recebido 100 alqueires de mata como honorários, em Guaraci.
Não faria nada mal, fazendo um favor ao velho, vindo procurar essas terras.
Veio, mas foi logo embora, porque elas tinham sido ocupadas por posseiros, que haviam derrubado a floresta e estavam plantando, alegremente. O pai achou que não valia a pena brigar.
As terras não valiam quase nada.
Naquela época, o cheiro fresco da terra roxa e aventura estimulava a imaginação de todos e agarrava qualquer um, pelo nariz. E foi sentindo a memória desse cheiro que ele resolveu voltar alguns anos depois, quando se meteu em sérias encrencas com a polícia lá do Rio.
Como militante estudantil na campanha do Petróleo E Nosso, ele se envolveu num tiroteio com a polícia diante da sede da UNE. Duas pessoas morreram e 18 ficaram feridas.
Ele foi condenado a quatro anos de cadeia.
O Norte do Paraná era uma terra de grandes oportunidades.
Mas era também o esconderijo de todo mundo que fugia de alguma coisa. E ele veio se esconder, para esperar a poeira baixar.
Fugiu da frigideira e caiu no fogo.
Manoel Ribas tinha acabado de assumir como interventor do Paraná e uma de suas primeiras medidas foi anunciar com estardalhaço que iria lotear a preços populares 120 mil hectares em pequenos lotes a noroeste de Londrina. A notícia espalhou como um rastilho de pólvora por todo o país e em pouco tempo, milhares de posseiros e suas famílias estavam invadindo a região de terras devolutas, gerando tensões e violência.
Tudo isso culminou no início da década de 50 com a "Guerra de Porecatú", ou como se chamava na época, a "Coréia Paranaense", chegando a reunir mais de 1 mil e 500 posseiros armados, reivindicando a legislação de suas posses. O PCB, colocando na ilegalidade em 47, viu naquilo uma oportunidade para colocar em prática o famoso "Manifesto de Agosto", tese de tomada do poder pela força. O partidão, como era conhecido, envolveu-se nos conflitos, organizando e treinando os posseiros em táticas militares.
Ele não podia ficar de fora e já chegou participando da "Campanha de Solidariedade Aos Resistentes de Porecatú". Mas isso ainda era pouco e logo depois já estava trabalhando na sucursal do semanário paulistano "Hoje", um órgão do PCB, em Londrina.
Ficou dois anos.
Logo a guerra da "Coréia Paranaense" acabou, a poeira no Rio baixou e ele voltou para casa.
Sem muita causa para agitar, resolveu dar um tempo e foi ser cronista esportivo.
Quando deu por si, estava famoso e importante.
João Saldanha acabou sendo técnico da seleção brasileira nas eliminatórias da Copa de 70. Quando ele escalou as suas "onze feras", Nelson Rodrigues vibrou, saudando-o como o único capaz de qualquer coisa para buscar o caneco do Tri.
Ele não foi o técnico na Copa, mas as suas "feras" foram tricampeãs.

Marcelo Oikawa, jornalista


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