domingo, 13 de julho de 2014

Histórias do Paraná - Em Cascavel tem cascavel

Histórias do Paraná - Em Cascavel tem cascavel

Em Cascavel tem cascavel
Moysés Paciornik

Há dias nesta coluna, um leão do Lions, sem ferocidade, cascavelense, sem veneno, explicou por que Cascavel continua a chamar-se Cascavel, apesar de não ter mais cascavéis.
A primeira vez que lá fomos furou o pneu do nosso avião.
Era um Douglas, da Real.
Vinha de Foz do Iguaçu.
Um dos passageiros desceria em Cascavel.
Daí a parada extraordinária.
No campo de pouso, campo mesmo, que todo coberto de capim original, nem bem o aviãozinho encosta, a asa direita baixa,
o bicho trepida, rabeia.
Na freada brusca, parece que vai tombar.
No susto:
- Que foi? Que foi?!
O jeito risonho do calmo e gorducho piloto vem nos desassustar.
- Não foi nada de grave.
Desce, volta para mostrar.
- Furou o pneu da direita.
Acertei bem nos cravos desta ferradura.
Algum cavalo a perdeu bem onde decidi pousar.
Na cidade deve ter borracheiro.
Enquanto conserto o pneu — calculo meia hora, uma hora — podem descer, passear por aí.
Do alto a gente vira na extensão imensa da impressionante floresta falha e mais falhas, chão coalhado de troncos de árvores recém derrubadas.
De cortar o coração.
De longe em longe, casebres isolados.
Depois de algum tempo o avião comecara a baixar em direção a duas fileiras de casas, ladeando rua de barro.
Uns duzentos metros, se tanto. O vermelho vivo das telhas mostradas a pouquíssima idade da "cidade".
A rua começava quase que diretamente do campo de aviação, situado num plano mais elevado.
Passeando, deu para constar, casas baixas, de madeira... Carroças.
Cavalos.
Jipes.
Tudo.
Caminhões, muitos. Carros, poucos.
Enlameados. Tudo enlameado.
Homens de botas, sapatões.
Mulheres, uma ou outra. Armazém.
Botequins, um maiorzinho. Entramos.
Provocamos o balconista.
- Só nos matos.
Aqui na cidade tinha, agora não tem mais.
- Então me sirva um refrigerante.
- O quê?
- Um refrigerante, gasosa.
- Ah, sim! Gasosa.
Temos.
Da qual quer?
- De framboesa, (coca-cola ele não conhecia, lá ainda não tinha chegado). E bem gelada.
- Gelada? Só fresca, frescor do porão.
Serve? (lá, eletricidade ainda não tinha chegado).
- Serve.
Neste calorão. A sede está de matar.
Quanto custa?
- Cinco mil réis.
- O quê? Está louco? Em Curitiba sai um mil réis cada garrafa.
- Em Curitiba? Aqui é Cascavel.
Por mil réis, vá matar sua sede lá em Curitiba.
Ora veja só. Passe bem.
Boa Viagem.
- Não, não, me dê assim mesmo.
E ainda diziam:
Cascavel em Cascavel? Não, só nos matos, na cidade não tem mais.
Não, hein? Mas, que a gasosa estava boa estava.
Naquele calorão, com aquela sede, valia bem os cinco mil réis.
Ou era cruzado? Ou era cruzeiro? Ou era... Que dinheiro será que era?

Moysés Paciornik, médico


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